Estou bem, obrigado!

Sebastião Catequista

Oi! “Estou bem, obrigado!” A quem pergunta essa é a resposta! Uma resposta simples, educada, sutil. Nada emblemática. Porém, tal resposta esconde algo, esconde sentimentos, dores, frustrações, desesperanças, escamoteia dos olhos perguntante “especulações”, esconde fragilidades, magoas e decepções.

O que se passa? O que se passa interiormente quando a queima roupa se é questionado sobre a sua situação e estado de ânimo? A pergunta que é meramente “retórica” devido aos clichês da educação, é apenas evasiva, e não tem conteúdo relevante de empatia, compaixão, de uma ação de quem realmente se importa com o outro. De que quer estar com ele, seguir com ele, sentir com ele, viver a sua dor, ensaiar resoluções, novas luzes, novas perspectivas. Pergunta e resposta são apenas mera casualidade educacional e cultural. Não revela a verdade do sentir e das relações de empatia, irmandade, solidariedade, da compaixão.

No mesmo nível um “Estou bem, obrigado!” ressoa com a mesma educação com que foi perguntado. Quem vai querer parar e te escutar? E se escutar o fará por um tempo muito breve e com a fineza da educação. Por educação! Não está interessado em sentir, ser solidário, ser empatia com você. Em calçar “os seus sapatos”. Entretanto, se parar por um instante e te escuta, o faz também, suponho, por respeito, dado o grau de sua relação de amizade ou porque de algum modo se sente moralmente “devedor” dado que, possivelmente, em outro momento foi ajudado por você. Mas não se engane, ele/ela não está interessado em seu momento de vida.

E por que não? Porque também de algum modo sua vida está em “correria” e bem “embaralhada”, sem que lhe dê “tempo” para fincar com você uma re-ação solidária. Nesse caso, aquela velha palavra de desculpa, aparece: “… estou com pressa outra hora agente conversa mais!”; ou, “preciso ir, me mantenha em contato”; ou ainda, “liga pra mim, se precisar de alguma coisa”.

Todas essas desculpas são formas de dizer: “não conte comigo”; “não posso fazer nada”. É uma forma de “sair fora” com fineza e educação. Mas também dentro desse “não posso fazer nada” enquanto desculpas saindo pela tangente, escutamos essas outras com mais ânimo e faz de conta que se importa ou torce por você:paciência, Deus não desampara!”; “Vai dar tudo certo, isso é uma fase, logo passa”; “Quem não tem problemas, não é verdade? Nada de desânimo, ok?; “Você é inteligente saberá o que fazer!”; ou ainda, “amigo não estou podendo fazer nada agora, estou….”, e há ainda outras mais…

Realmente, ninguém está obrigado a ser empatia com você e muito menos ser e sentir com você, até porque, cada um tem sua vida, sua história, seus sabores e dissabores.

De que estamos falando aqui até agora? O que está por trás dessa narração? Penso que do sentido de sermos humanos, de irmandade, solidariedade, de sentimentos, de vida, da vida fragilizada e em perigo cuja bolha não consegue sintonizar no mesmo nível e sentido de tantas e tantas outras bolhas cujas vidas humanas seguem seu destino sem se mesclar umas as outras. Estou falando da vida solitária, individualizada, enfraquecida pelas tantas quedas da própria vida e que não consegue sequer sintonizar com as outras vidas ou delas ter a ajuda de que precisa para seguir sua própria sina. Estou falando de humanidade, de empatia, fraternidade, solidariedade, dessas coisas que de algum modo nos faz humanos e cristãos, se assim eu, você, nós, nos identificamos.

Alguma coisa em nossa modelo de sociedade e em nosso jeito de ser humano não anda bem e faz muito, mas muito e muito tempo. Talvez sejamos a geração mais egoísta, individualizada, não solidária, e mais emblemática que a História humana já tenha até o presente momento registrado.

Mas enfim, voltemos à pessoa, personagem de nossa escrita e inspiração. Imagine que esse “está bem” seja intenso e carregado de histórias e contradições da própria história de vida. Que sentimentos está pessoa traz nessa fala? Quais mazelas e desafios de sua história carrega? Que forças estão lhe habitando a alma? Não sabemos! Talvez saibamos de sua história em seus altos e baixos, por um “ouvi dizer” ou talvez conheçamos dela alguma coisa de seus próprios relatos ou que tenhamos presenciado. Mas isso é muito pouco para adentrar dentro de sua “psiquê”, dentro do seu “eu” mais profundo e averiguar seus sentimentos, fraquezas e grandezas. O fato é que, uma pessoa assim está susceptível a tudo e a nada. Seu “estou bem, obrigado!” pode ser realmente que mesmo em meio as adversidades esteja bem; e isso indica que está tentando se superar e superar os percalços da vida, ou , inclusive se o contrário, pode vir numa hora que ninguém espera, sucumbir à própria morte.

E se ele tira sua vida? Grande comoção com as indagações de sempre: “ele estava tão bem, não mostrava sinais de que poderia fazer algo assim”; ou “ele era tão alto astral, tão serviçal, quem iria adivinhar que estava passando por uma fase que terminasse assim?!”; ou ainda, “dizem que ele estava…” e os murmurinhos com estórias daqui e dali vão aparecendo, porém, o sentimento de todos é um só: “Como pode acontecer isso?

Nessa fala está a mistura de perda, tristeza, surpresa, impotência, memórias, e um superficial e não formalizado julgamento. Com o tempo, sua memória se instigue, exceto na vida daqueles que de algum modo alguma marca ficou.

De que mais estou falando nesse artigo? Não sei quanto a você meu caro leitor/a, que deve está pensando mil e uma coisa, ou que já passou por isso, ou que conheceu alguém que já viveu essa experiência, ou mesmo quem sabe, deve está me analisando…

Talvez você ao ler esse artigo esteja também me analisando nas entrelinhas. Pensando consigo se isso talvez não esteja acontecendo com o autor dessas linhas… não sei! Mas de uma coisa eu sei, esse artigo nos traz uma verdade bem concreta e humana: de algum modo estamos perdendo a capacidade de nos irmanarmos uns com os outros numa fraterna e solidaria ação de escuta e ajuda mútua como sendo algo imperativo ao amor.

Se há uma coisa que chamava atenção aos de fora do cristianismo primitivo, era a capacidade de empatia, de solidariedade, de fraternidade de uns com os outros. E segundo o livro Sagrado, muitos se converteram ao cristianismo justamente por causa dessa capacidade de acolher o outro na sua vida e necessidades de modo que esse testemunho subvertia a lógica e a ordem da sociedade de então. Confira Atos 2,42-47.

Depois disso, ao longo da história muitos tentaram viver esse programa de vida como sendo sua marca registrada do seu testemunho e seguimento de Jesus. Movimentos dentro e fora do cristianismo europeu deixaram suas marcas na História. Mas o “sistema” sempre foi maior e eles ficaram e ficam como “retrato” que é possível sim, em algum lugar da vida tal programa dá certo. Infelizmente o individualismo, o consumismo, o “cada um por si e Deus por todos” sobretudo na sua nova e mais recente versão “família, pátria e Deus” tomaram conta de nossas vidas. De repente esse sistema perverso que gelou nossas almas, roubou nossas consciências e nos fossilizou em nossa compaixão enquanto ser um com outro (ubuntu), em linguagem africana, reino de Deus ou vida, na linguagem cristã, tem nos desumanizado, igual o morcego, que chupa o sangue de suas vítimas abanando elas com suas asas, para não sentirem e nem se aperceberem de que estão morrendo.  Assim estamos nós!?!

Seja como for, é preciso exercer em nós a empatia, a escuta, o olhar aberto, o sentir o outro sentindo a nós mesmos. É preciso sensibilidade, está atento ao que o outro nos diz e mostra. É preciso sair um pouco de nós mesmos… caso em contrário, perdemos a própria essência humana, perdemos a vida.

É preciso ler nas entrelinhas das falas dos outros (e até as nossas mesmas) o que nossos olhos e sentimentos não veem. Somos felizes e nossa vida encontra sentido quando nos conectamos uns com os outros. Somos humanos – ubuntu.

É preciso precisar parar, escutar, nos escutar para escutar o outro, é preciso por esse tempo nos humanizar. Humanizar é preciso! Precisamos nos redescobrir humanos e como humanos nos ajudarmos mutuamente. Assim, seremos salvos!

Como vai você? Estou bem, obrigado!

Sobre Sebastião Catequista 94 Artigos
Olá! Sou Sebastião Catequista. Sou educador popular e narrador dos conteúdos bíblicos. Sou Catequista. Habito a Igreja Católica e me identifico como tal, meu lugar de fala é a partir dos Grupos e Comunidades Eclesiais (ceb's), Pastorais e Movimentos Populares. Faço parte do CEBI (Centro de Estudos Bíblicos) da Região Nordeste, Estado de Pernambuco. Atuo como Catequista e Agente de Pastoral em diversas atividades eclesial. Blogueiro, assessor, palestrante, criador de conteúdos, sou católico de fronteiras: isto é, sou Ecumênico, de profundo Diálogo inter-religioso com outras Tradições religiosas cristãs e não cristãs. Adoro ler, curtir a natureza, passeios, fotos, músicas e bons filmes. Sinto-me encantado com a Vida e agradecido. Sou um contemplativo nato. Adoro o mundo da Teologia e da Ciência da Religião. Praticante da espiritualidade dos Padres do Deserto e da Oração de Jesus, aqui compartilho textos diversos, reflexões, estudos em torno da fé, da espiritualidade, da catequese, da liturgia, da teologia de modo geral, do ecumênismo e do diálogo religioso cristãdas. Agradeço sua visita e apreciação de meus textos. Seja bem-vido(a)! Que a Paz esteja contigo e que nosso blog te possa ser útil na jornada da Vida. Boa leitura!

2 Comentários

  1. Que texto encantador, com tanto sentido e reflexão. Nos faz pensar em nossas atitudes, acolhidas e vivências. Quantas vezes a educação do ESTOU BEM, obrigada! Esconde dores e sofrimentos aos nossos olhos ficam invisíveis. Humanizar, ser humano, olhar pra outro, estar com o outro, sairmos do automático e viver o agora. Nos encontrarmos com o que e quem somos e assim enxergarmos o outro.

  2. Você foi perfeito em cada palavra. Precisamos repensar a nossa forma de viver.

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