Obediência
Sebastião Catequista
O voto da obediência não é um voto de restrição e nem a isto está ligado, mas é a capacidade de compreender os limites e o nosso papel no jogo das relações. Entender quão criativos podemos ser na capacidade de superar conflitos, barreiras, e nos reinventar perante os desafios. Obediência não se trata de “o-be-de-cer” às cegas (não confundir com subserviência), ou mesmo nos limitar em nossas capacidades mas sim, trata-se de nos abrir horizontes sob novas perspectivas. Mesmo contra a vontade a obediência nos desestabiliza porque nos tira da zona de conforto e nos provoca reações das mais diversas causando inclusive inseguranças porque justamente nos desloca da zona de conforto. Em muitas situações e circunstâncias a obediência causa mal-estar. Historicamente, culturalmente e psicologicamente nossa relação com ela sempre foi de forma negativa e de de violência. Desobedecer é um ato e um grito de rebeldia cujo protesto quer evitar esse desconforto que se fecha ao novo, ao desconhecido, mesmo que ele venha ao encontro de nosso estar bem.
A obediência é uma virtude mas em certas circunstâncias é um “mal necessário” para um “bem maior”, uma “cirurgia na carne” que renova a vida, corrige rumos, traz novas perspectivas, e nos coloca no estado permanente de revisão sobre nossos próprios destinos.
De outro modo, se assim podemos compreender a virtude da obediência, quando é lícito obedecer? Dizendo de outro modo quando é lícito dizer-lhe não, e em que dado momento “obediência” deixa de ser obediência e passa a ser subserviência? Tais perguntas levantadas se configuram o campo próprio da moral e da ética e a depender do seu contexto, circunstâncias e pano de fundo a resposta será diferente do que se diz por exemplo do campo jurídico e mesmo da contribuição teológica e eclesial.
Enquanto instrumento que compõe os votos da vida consagrada religiosa, a obediência é um instrumento pedagógico de direção, correção e disponibilidade em que a pessoa consagrada religiosa se coloca a disposição no sentido de melhor servir e não estabilizar-se na mesmice da vida e no tédio de uma vida fácil e medíocre. Na vida consagrada religiosa o voto de obediência está associada a ideia de se deixar conduzir por outrem, seja uma regra ou/e pessoa ou mesmo um ideal cujo sentido dá a vida “algo para viver” de modo pleno. Desse modo ele soa tão natural quanto a própria vida.
O voto de obediência também regula as relações entre as pessoas e mantém a individuação de cada um naquilo que lhe é próprio de sua individualidade e na sua alteridade. Com ele celebra-se a harmonia e se estabelece a ordem no caos, constrói-se pontes e se estabelece o chão donde o amor brota em ações eficazes qual flores no jardim.
Obedecer não é uma questão de mandar e ser mandado, de obedecer pura e cegamente, mas é uma questão de conduzir e se deixar conduzir. Trata-se de confiança e entrega total com todas as consequências que essa atitude traz. Em linguagem teológica é caminhar na fé abraâmica e na insegurança, de quem tem dentro de si certezas incertas e por isso mesmo obedece perfazendo o caminho…
Obediência é uma virtude que ao contrário do que as pessoas pensam em se tratar de umas sobrepôr-se sobre os outras, em ordem de comando e subserviência servil, é uma atitude de humildade que se deixa guiar na fé, a partir de outrem, sem que isto lhes tire a liberdade e as responsabilidades que lhe configura como pessoa livre, madura, adulta, e plena. Obediência não é uma prisão, é um processo pedagógico de libertação e da própria condição humana. Na vida cristã de modo geral e na vida consagrada religiosa é uma virtude que indica o caminho certo do bem viver.
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